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segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Médicos acusados de roubar órgãos de pacientes vivos são julgados

 

O caso ocorreu em Taubaté, em São Paulo. Os réus são o nefrologista Pedro Torrecillas, o urologista Rui Sacramento e o neurologista Mariano Fiore Júnior.


 




Uma história chocante. Começa nesta segunda-feira (17) o julgamento de três médicos acusados de roubar órgãos de pacientes ainda vivos. O caso aconteceu em Taubaté, interior de São Paulo. A reportagem é de Valmir Salaro.
A história envolvendo a família de Vânia Cristina já dura 25 anos. Em 1986, o irmão dela, Alex, na época com 15 anos de idade, foi atropelado e deu entrada no Hospital Santa Isabel, em Taubaté, com traumatismo craniano. Dois dias depois, a família recebeu o diagnóstico de morte cerebral. Vânia conta que a mãe se recusou a doar os órgãos, mas por ser analfabeta acabou assinando a autorização sem saber.
“Pediram que ela voltasse depois do processo para assinar o que seria a liberação do corpo. Na verdade, era a autorização para a doação dos órgãos. Minha mãe não sabia que os órgãos do meu irmão seriam doados”, disse Vânia Cristina, irmã de Alex de Lima.
A doação, supostamente feita à revelia, não seria o maior drama enfrentado pela família de Vânia. Pouco tempo depois, surgiu a suspeita de que os órgãos teriam sido retirados com Alex ainda com vida.
“Eles não têm esse poder de tirar a vida de alguém e ainda decidir o que fazer com os órgãos”, acrescentou Vânia Cristina, irmã de Alex de Lima.
O processo que apura a morte de Alex de Lima e de mais três pacientes do antigo Hospital Santa Isabel, hoje Hospital Regional, tem 54 volumes e levou dez anos para ser concluído. As denúncias partiram do doutor Roosevelt de Sá Kalume, na época diretor da Faculdade de Medicina da Universidade de Taubaté. O hospital-escola desenvolvia um programa de transplante de órgãos. Em dezembro de 1986, ele descobriu que um grupo de médicos montou um programa de transplantes de rins – segundo ele, de forma clandestina.
“Eu era o chefe desses médicos, esse programa acontecia em nome da faculdade e eu não tinha noção que isso estava acontecendo. Essa é a história”, afirmou o médico Roosevelt de Sá Kalume.
Os réus do processo são o nefrologista Pedro Torrecillas, o urologista Rui Sacramento e o neurologista Mariano Fiore Júnior. Um quarto réu do processo, o também neurologista Antônio Aurélio Monteiro, morreu em maio deste ano. Depois de duas décadas e meia, o julgamento finalmente vai começar nesta segunda-feira (17).
A expectativa é de que o julgamento dure, pelo menos, quatro dias no Fórum de Taubaté. Ao todo, 25 moradores da cidade foram convocados, mas sete vão decidir na sala do júri se os médicos são inocentes ou culpados pelas mortes dos pacientes. A acusação é de homicídio com dolo eventual, quando se assume o risco de matar.
O doutor Kalume, hoje aos 64 anos, continua acusando os colegas de precipitação ao atestar a morte encefálica para a retirada de órgãos para transplante.
A morte encefálica é uma condição irreversível do cérebro, quando ele deixa de receber o sangue que vem do corpo e para de funcionar totalmente. Os acusados vão ter de provar na Justiça que os pacientes estavam com morte cerebral. Sem esta comprovação, fica caracterizada a prática da eutanásia, quando o médico abrevia a vida de um paciente e que é proibida no Brasil. Desde o início do processo, todos os acusados negam o crime.
“Claro que eu não matei aqueles quatro pacientes para retirar os órgãos. Eu sou absolutamente inocente”, afirmou urologista Rui Noronha Sacramento.
“Ele passou pela mão e foi examinado por sete médicos. Ele ainda fez uma prova de morte encefálica. Além do exame clínico, ele fez um eletroencefalograma” , o nefrologista Pedro Henrique Torrecillas..
“Todos tinham morte clínica comprovada. Eu fazia o diagnóstico, escrevia o diagnóstico e fazíamos um exame complementar, no meu caso foram angiografias, ou seja, uma agulha, um contraste, fazia uma injeção no pescoço e verificava se havia fluxo cerebral ou não”, o neurocirurgião Mariano Fiore Júnior.
Os principais argumentos do Ministério Público para a acusação são dois laudos: um do Instituto Médico-Legal e outro do Conselho Regional de Medicina, que concluíram que os pacientes não estavam com morte encefálica, quando os rins foram retirados.
“Os médicos não fizeram o diagnóstico de morte encefálica e, mesmo nesta situação, submeteram esses pacientes à retirada dos rins”, apontou o promotor Márcio Augusto Friggi de Carvalho.
Além das provas documentais, o Ministério Público conta com o depoimento de uma testemunha-chave: a enfermeira Maria Rita Pereira. Ela conta ter visto um paciente, supostamente morto, sentir dores durante a cirurgia para a retirada dos rins.
“Quando eu olhei, os rins já estavam em cima da mesa. Ele falava: ’Vai, vai. Suturando’. Sabe aquela coisa, assim, correria? E perguntava: ‘Não terminou ainda?’. Eu: ‘Como? Ele não para’. E, realmente, não parava mesmo. Ele estava lá se debatendo, aquela coisa horrorosa. Ele falou: ‘Não para? Espera aí que vou mostra para você’. Aí, ele pegou a lâmina e furou o cara”, afirmou a enfermeira Maria Rita Pereira.
A enfermeira foi intimada como testemunha de acusação para contar o que diz ter visto ao júri, já que o depoimento dela não consta do processo.
“As vítimas foram submetidas a essas cirurgias, chamadas nefrectomias, e tiveram os dois rins extraídos. O destino desses órgãos é um mistério”, contou Márcio Augusto Friggi de Carvalho.
Os três acusados continuaram clinicando durante todo o período do processo. Em defesa deles está a decisão do Conselho Regional de Medicina de São Paulo e do Conselho Federal de Medicina, que absolveu os quatro médicos dos crimes de eutanásia e tráfico de órgãos.
“O que é mais importante. Primeiro que ele é inocente, segundo que não há provas de que os pacientes estivessem vivos e terceiro que não há nenhuma prova que contrarie o diagnóstico de morte cerebral dele”, explicou o advogado de defesa Sergio Salgado Badaró

fonte: http://g1.globo.com/bom-dia-brasil/noticia/2011/10/medicos-acusados-de-roubar-orgaos-de-pacientes-vivos-sao-julgados.html

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