Total de visualizações de página

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

'Novo Papa tem que estar antenado com o mundo', diz Dom Geraldo


'

Cardeal é um dos 115 que vão participar de conclave que escolhe pontífice.
Ele falou sobre os desafios atuais da Igreja Católica com essa mudança.

Ida Sandes*Do G1 BA
6 comentários

dom geraldo magella (Foto: Ida Sandes / G1)Dom Geraldo Majella dá entrevista antes de
embarcar para o Vaticano (Foto: Ida Sandes / G1)
Às vésperas do conclave que vai eleger o novo Papa, o cardeal arcebispo émérito de Salvador, Dom Geraldo Majella Agnelo, disse ao G1 que o novo pontífice "deve estar atento com o mundo inteiro". Ele concedeu  uma entrevista pouco antes de embarcar para o Vaticano, na noite de domingo (24).
Dom Geraldo falou sobre os desafios atuais da Igreja Católica, do perfil do futuro Papa, sobre como funciona a cerimônia do conclave e de uma possível influência de Bento XVI na escolha do novo sucessor.
Ele é um dos 115 cardeais que devem participar da escolha do novo Papa, sendo que cinco deles são brasileiros. Além de Dom Geraldo Majella, os demais brasileiros concorrentes e votantes são o arcebispo de Aparecida (SP), cardeal Dom Raymundo Damasceno de Assis, de 76 anos; o arcebispo emérito de São Paulo, Dom Claudio Hummes, de 78 anos; Dom João Braz de Aviz, de 65; e o arcebispo de São Paulo, Dom Odilo Pedro Scherer, de 63.
Leia a seguir os principais trechos da entrevista do arcebispo emérito de Salvador sobre a escolha do novo pontífice.
G1 - Diante dos desafios atuais da Igreja, qual o perfil que o futuro Papa deve ter?
Dom Geraldo - A idade não pode ser uma condição. O importante nele é que seja um homem que com a sua visão, com a sua preocupação, abarque todo o mundo. Ele não pode fazer exclusão de preocupações. Tem que se preocupar com toda a igreja. É importante que tenha a capacidade de estar atento, antenado com o mundo inteiro, para que ele possa, diante de Deus, suscitar a este mundo um pouco de esperança.
G1 - O senhor acha que existe chance de um cardeal da América Latina ou um africano ser um Papa, quem sabe até um brasileiro? Existe abertura para essa escolha?
Dom Geraldo - Essa pergunta também foi feita quando chegou um Papa que veio de longe. Durante 400 anos, os Papas eram italianos. Com João Paulo II, ele veio de longe, veio da Polônia. Depois dele, veio o Papa Bento XVI, que é alemão. Na segunda vez nem se colocou a preocupação. Vem de Roma, vem da Itália, vem de longe. Ninguém se preocupou. De todo jeito, ainda era da Europa. Agora, nós já temos uma visão de mundo. Eu acho que está aberto para todo mundo.
G1 - O senhor já sabe em quem vai votar?
Dom Geraldo - Acho que tem que ser um homem acolhedor. O Papa João Paulo [II] não falava tanto, mas era uma pessoa que você sentia acolhimento. Isso é importantíssimo. Que o [novo] Papa também seja uma pessoa acolhedora, muito acolhedor, muito pastor. Cristo é o bom pastor. Um bom pastor para a Igreja. E uma pessoa que seja ele mesmo. De fato, graças a Deus, a gente tem visto sempre no Papa uma pessoa que é uma testemunha. Que ele possa demonstrar isso.
Papa Bento XVI abençõe multidão de fiéis presentes neste domingo durante a oração do Ângelus (Foto: Alberto Pizzoli/AFP)Papa Bento XVI abençoa multidão de fiéis presentes no domingo (24) durante a oração do Ângelus (Foto: Alberto Pizzoli/AFP)
G1 - Pelo fato de estar vivo, o Papa Bento XVI pode ter alguma influência na escolha do seu sucessor?
Dom Geraldo - Ele se manifestou que não quer ter nenhuma influência nesse sentido. Ele está aí até hoje, segunda-feira, terça-feira, eu não sei, está anunciando um motu próprio [documento papal que pode mudar a legislação [nesta segunda-feira (25), Bento XVI aprovou que o conclave seja adiantado]. Quer dizer, é uma intervenção dele nas normas para o conclave. Nas normas, ele não estará presente. Dia 28, ele se retira para Castelo Gandolfo. Já não é mais o Papa. Todo mundo vai dizer “Papa Bento”. Assim como diz “bispo emérito”, “Papa emérito”. Se, como agora, nesse tempo em que as comunicações e as viagens podem ser feitas em 24h, a maioria, no máximo 30h, de uma parte do mundo para outra, a presença é muito... Se faz muito mais rápida. Tendo uma boa presença em Roma, o Papa Bento ficou preocupado e disse: "Bom, então, pode-se começar antes”. Mas isso iria contrariar a norma vigente, então a intervenção dele.
G1 - Então não houve nenhum tipo de antecipação?
Dom Geraldo - Não, não. Nós estamos esperando essa intervenção dele. E, pelo que foi dito pelo porta voz do Vaticano, ele vai convocar uma reunião com os cardeais que estiverem, pedindo que se reúnam imediatamente no dia seguinte para decidir quantos dias para começar o Conclave.
G1 - E a data vai ser definida nessa reunião?
Dom Geraldo - Nessa reunião pode ser antecipada. Provavelmente será proposto dia 10. Um tempo precisa. Mas em vez de esperar quinze dias ou vinte dias...
G1 - Há algum tipo de urgência?
Dom Geraldo - Não, não. Sabe o que acontece? É que os cardeais estão em Roma, fica mais fácil aproveitar o seu tempo.
G1 - O senhor conversou com os demais cardeais brasileiros a respeito da escolha?
Dom Geraldo - Não, não cheguei. Só mesmo na viagem. Eu vou agora. Dom Odílio, Dom Damasceno e eu ficaremos no colégio Pio Brasileiro. Isso já definimos. Estaremos ali conversando. Não pode falar de outra coisa. Tem que falar necessariamente, mesmo que tenhámos muitos outros assuntos, mas esse é um assunto que não pode... Agora, nós não vamos fechar assim: "Olha, nós vamos votar em fulano".
G1 – Existe isso?
Dom Geraldo - Não.
G1 - Como o senhor viu a renúncia do Papa Bento XVI?
Dom Geraldo Majella - Não havendo após 600 anos, não se pensa que o Papa vai renunciar, mesmo vendo a situação do Papa Bento XVI na sua debilidade física, fragilidade física. Lembra também do Papa João Paulo II, que era um homem cheio de vigor, mas que, no fim, teve um declínio muito pesado. Ele olhava tudo, mas não tinha aquela comunicação de falar, como gostava antes. Eu recebi [a notícia] imediatamente lembrando do passado e, ao mesmo tempo, dizendo que ele fez um ato de coragem, um ato de humildade em um mundo onde as pessoas estão tão preocupadas pelo primeiro lugar, de ir na frente, de ser mais votado. Alguém renunciar é difícil. Eu acredito que o Papa também, intimamente, tenha sentido profundamente o que ele estava fazendo. Agora, vamos ver a capacidade dele também de resistir até o fim.
G1 - Como funciona o ritual da escolha do novo Papa?
Dom Geraldo Majella - Nós nos recolhemos na véspera do início do conclave propriamente dito. Na véspera, vamos para a casa de Santa Marta, em Roma, que é vizinho da Basílica de São Pedro. Para nós irmos até a Capela Sistina, a gente deve fazer um percurso para depois subir para a Capela Sistina, aonde se faz o lugar da missa para o início e também aonde nós iremos fazer, de fato, as votações.
G1 - Quem acha que tem mais possibilidade de ser o novo Papa?
Dom Geraldo Majella - Olha aqui, se você toma o número dos cardeais por procedência, os italianos são os mais numerosos e, por isso, durante 400 anos, todos os Papas foram italianos. Foi com João Paulo II é que começou [a mudança], ele é polonês. E depois com o Papa Bento [XVI], alemão. Há possibilidade, mesmo que fosse de um país mais longe, ele pode ser eleito, não é que seja difícil. O Papa pode vir de qualquer parte e eu também tenho bastante espírito de fé de que não é uma escolha política, de grupo, para satisfazer a isso, a aquilo. É alguém em que eu vejo a possibilidade de ser o eleito de Deus.
G1 - Acha que o senhor pode vir a ser o Papa?
Dom Geraldo Majella - Eu já tenho idade. Vou fazer 80 anos em outubro desse ano. Eu não acredito que seja normal ser escolhido para uma hora dessa.
Freiras fazem reflexão antes da oração do Ângelus, a última conduzida pelo Papa Bento XVI, que deve oficializar sua saída como líder da Igreja Católica na próxima quinta-feira (Foto: Alessandra Tarantino/AP)Freiras fazem reflexão antes da oração do Ângelus,
a última conduzida pelo Papa Bento XVI
(Foto: Alessandra Tarantino/AP)
G1 - Esta é a segunda vez que o senhor participa da escolha de uma Papa. Quais são as memórias que o senhor tem daquele momento?
Dom Geraldo Majella - É interessante. Pouquíssimos, não sei se chegava a 10%, tinham participado do conclave que elegeu o Papa João Paulo II. Pouquíssimos. Para a maioria absoluta, era novidade. Todo mundo estava esperando como seria o cerimonial. Quando chega na reunião de votação, a gente tem, diante de si, também uma folha grande, onde tem o nome de todos os cardeais presentes e, ali, pode fazer anotação que quiser. Depois, tem já cédulas para votar. A gente começa a reunião de votação evocando o Espírito Santo, depois tem alguns avisos práticos para o procedimento. Quando vai ser feita a votação propriamente dita, cada um faz o seu voto em sigilo e depois um por um se apresenta diante do altar com o seu voto fechado, mas mostrada com a mão elevada: "Eu voto diante de Deus, com a minha consciência, eu tenho o meu voto", sem dizer para quem. E aí a gente tem lá dois cerimoniários que estão lá no altar e há um cálice grande, largo. Abre, põe o voto, fecha e volta para o seu lugar. Vem o segundo, terceiro...
G1 - E a escolha do Papa Bento XVI, como foi?
Dom Geraldo Majella - Realmente, a figura do Papa Bento, como cardeal, eu conhecia de perto porque morava em um lugar que ele trabalhava. No mesmo prédio. Todos os dias eu descia e ele, como morava do outro lado da praça de São Pedro, chegava. A gente se saudava e ia cada um para o seu trabalho. Ele esteve na minha casa, jantou como cardeal. O contato pessoal, para mim, foi uma graça, ter podido trabalhar em Roma e estar com o futuro Papa. Vou empregar a palavra "impunha" à sua personalidade, diante da Igreja. Não em sentido pejorativo. Era normal, da personalidade dele. Foi um homem que estudou a vida inteira.

G1 - A renúncia de Bento XVI trouxe um sentido de urgências às reformas?
Dom Geraldo Majella - A urgência vem pela natureza das coisas, das interrogações que são feitas à Igreja. Aconteceu agora, mas que não vai atropelar e querer que se faça de qualquer jeito. Não. A Igreja é chamada para fazer as coisas com bastante oração e com bastante estudo
G1 - Vigor físico e idade passarão a ser critérios?
Dom Geraldo Majella - Necessariamente, não. No passado, às vezes, se dizia assim: "bom, o Papa que for escolhido é um Papa de transição". Quer dizer, ele, como Papa, devia trabalhar. Mas não que vai apressar. É uma coisa que a Igreja, desde o Papa, até mais na base, que as coisas devem ser tratadas como pedidos das luzes do Espírito Santo e o estudo que é necessário. Nós temos a organização das nossas dioceses, das nossas paróquias, dos conselhos e tudo, momentos de estudo. Tudo isto é normal e deve continuar.
Freiras balançam bandeira do Vaticano durante benção dominical do Papa Bento XVI, a última como líder da Igreja Católica (Foto: Eric Gaillard/Reuters)Freiras balançam bandeira do Vaticano durante benção dominical do Papa Bento XVI, a última como líder da Igreja Católica (Foto: Eric Gaillard/Reuters)
G1 - Registram-se consideráveis diferenças em problemas que a Igreja enfrenta em regiões como a Europa, América do Norte, América Latina e África. É um fator a ser levado em conta pelo conclave?
Dom Geraldo - Isso é natural, é normal. Conheço um pouquinho o mundo, já estive em todos os continentes, a gente vê essa diferença. Isto tem que ser levado em consideração. Se você toma, por exemplo, os documentos do concílio, dizem respeito ao mundo todo, mas também se prevê aquilo que, vamos dizer, é próprio de um país para que se leve em consideração.
G1 - Em que medida um gesto tão eloquente de um Papa afeta os trabalhos do conclave para escolher o sucessor de Bento XVI?
Dom Geraldo - Certamente os cardeais estão pensando como toda Igreja, que há 600 anos não havia uma renúncia. Como proceder agora? Nós, os cardeais, estamos planejando chegar antes do dia 28 a Roma, para poder estar mais perto do Papa, para rezar com ele, celebrar com ele e demonstrar a nossa amizade pessoal.
G1 - Como o senhor interpreta as palavras de Bento XVI, segundo as quais agora é a hora da verdadeira renovação da Igreja?
Dom Geraldo - Olha, a Igreja deve sempre se renovar porque a história prossegue. Hoje, sobretudo, os acontecimentos estão em mudanças rápidas. Não é como antigamente. Por exemplo, para os concílios, se preparava um esquema para ser tratado e, às vezes, era interrompido o concílio por anos e anos e anos... 10, 20 anos. Ficava com o mesmo esquema introdutório. Hoje, não. Chega com o esquema e, na primeira reunião, cai tudo. Porque tudo hoje está em mudança. É um momento realmente de interpelação da Igreja.
* Colaborou TV Bahia

fonte: http://g1.globo.com/bahia/noticia/2013/02/novo-papa-tem-que-estar-antenado-com-o-mundo-diz-dom-geraldo.html


Nenhum comentário:

Postar um comentário